Por Carlos Monteiro – Fotógrafo
O maestro que deu o tom musical da cidade
Hoje, o Redentor, por alguns minutos, juntou os braços para algumas palmas e uma bênção. Ele, o Pai Eterno, faz 90 anos bem vividos este ano, apesar de todos os pesares que vem assistindo encimando o Corcovado, se mantém atento glorificando a cidade e zelando por seus habitantes. Abençoou o maestro Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, regente de plêiades angélicas formadas por harpas angelicais no páramo, céus cariocas, quiçá tupiniquins, pelos seus 94 anos que seriam completados nesta segunda-feira, 25 de janeiro. Um reflexo, uma reflexão. “…Cristo Redentor/Braços abertos sobre a Guanabara…”.
Tom foi considerado, em 2008, pela revista americana Rolling Stone o maior expoente de todos os tempos da música popular brasileira. Uma honraria absolutamente merecida pelo legado e contribuição que deixou, o que não foi pouco. Foi compositor, maestro, arranjador, violonista, flautista, pianista, cantor, conhecedor como ninguém da natureza carioca, ornitólogo ‘de ouvido absoluto’, capaz de reconhecer um canto em seu primeiro trinado. Tinha fascinação pela composição geofísica do Rio de Janeiro.
“Essas pedras que invadem essas águas, esses mares que invadem esse litoral”. O resto é mar da onda que se ergueu no Leblon de Lígia. O vi, algumas vezes, no Jardim Botânico do Rio, embevecido com o esplendor que se debruçava sobre ele em forma de sons, cores e aromas. Tive a impressão de que estava num transe sonoro, em puro êxtase. Nunca me atrevi a perturbar a paz daqueles momentos, muito menos com os disparos da câmera analógica, cujo drive provocava um ‘barulho ensurdecedor’. Preferi observar o Mestre em plena atividade criativa-contemplativa, arrebatamento poético, enleio arrebatador. Parecia levitar e como flutuava, navegava no azul do firmamento, era pura leveza no silêncio lento, trovador cheio de estrelas.
Hoje, floresce o Jardim Botânico, suas alamedas, sua fauna. A Sumaúma de Tom majestosamente dá boas-vindas aos visitantes em meio ao mar de tranquilidade, oásis em êxtase dos bairros que o circundam. Pura homenagem, puro preito, apenas láurea a quem lhe teve como musa.
O Maestro, que deu o tom a Cidade Maravilhosa e que tem no nome o gentílico de sua pátria impresso em sua certidão de nascimento – um brasileiro, Tom Jobim juntamente com Billy Blanco, que apesar do nome estrangeirado, é nascido em terras de Nazinha, salve ela, e criado nas bandas de cá pelas brancas areias do Leblon, talvez tenha se inspirado na paleta de cores do Almoxarifado de Deus, tons especiais, para compor “Sinfonia do Rio de Janeiro – Hino ao Sol”.
Nosso grande poeta das notas não deve andar muito feliz com os últimos acontecimentos. O Dia Nacional da Bossa Nova, efeméride em homenagem ao seu aniversário, será para pedir a tristeza que diga ao Villarino que volte. Sem ele não dá ‘pra’ viver.
Neste 25 de janeiro, a natureza fez simbiose com o monumento do Cristo, integrando o material com o natural como se emergisse entre as nuvens nos céus cariocas. Uma forma de agradecer ao nosso Tom em nuances, timbres, modulações em gama policrômica. O Sol chegou sol, clave, quinta na segunda, uma oitava acima. Luz divinal, magnífica, suprema eternidade. Os pássaros sustenidos bemol, quarta aumentada, gorjearam como nunca. Gorjearam mais por cá que acolá. E como chilraram. O primeiro canto do sabiá-laranjeira, do bem-te-vi, dos tucanos, das maritacas-de-cara-preta espalhafatosas, dos canários-da-terra, o piar dos gaviões que se fazem espectadores, em seus voos rasantes. Amanhece e os biguás, já atentos desde a madrugada, empoleirados nas árvores nativas do entorno da Lagoa, partem em busca do “peixe nosso de cada dia”, mas sem não, antes de tudo, pedir “a bênção” ao Redentor imponente, encimando a montanha sagradamente majestosa. Traçam seus caminhos em ‘V’ como se indicassem para onde se dirigem. Sobrevoam a cidade de ponta a ponta. Albatrozes e fragatas pairam, leves, soltos aproveitando as térmicas, pássaros da manhã. Fragatas, como sempre, mas hoje mais que nunca, bailaram o dançar desta cidade, Íbis de açúcar e afeto, parnaso carioca.
Tom era puro amor, nascido na Tijuca e vivido em Ipanema e no Horto, amava a cidade que tinha como cais e eternidade, feita só para ele, céu, mar e praias sem fim. Não gostava desse gostar leviano, amava profundamente, um amor que o fazia mais que feliz, um amor tão verdadeiro que a cada ausência o fez chorar e cada volta foi apagada pela ausência causada. Cada verso seu foi para te dizer “eu sei que vou te amar por toda minha vida” se ‘apropriando’ do Poeta Maior.
Por essas e tantas outras que cantamos aos quatro cantos: “…Tom, como eu gosto de você…”.
Maestro-mestre: “eu sou apenas um pobre amador, apaixonado.
Sou, tão somente, aprendiz do teu amor”.
Parabéns! Tu és o Sol que caiu no mar, és aquela luz brilhante que se acendeu no firmamento.
És tom das cores musicais.