por Aleluia, Hildeberto
A propósito da recente visita do Papa Francisco a Jerusalém um pouco da história da Palestina na trajetória desse intrigante personagem que conhecemos como Saladino.
A inteligência, como espionagem e informação militar começou a se estruturar nas batalhas de guerra cerca de dez séculos depois de Cristo (D.C.) e o responsável pelo princípio dessa organização foi um líder islâmico árabe chamado SALADINO. Foi ele um dos primeiros, no segundo milênio D.C. a valorizar a informação como arma. Seu nome verdadeiro era Yusuf ibn Ayyub, e seu povo o chamavam por Slalah-al-Din “o retificador da fé”, e como Saladino pelos exércitos das cruzadas.
Segundo Ernest Volkman em seu livro A HISTÓRIA DA ESPIONAGEM, lançado no Brasil em 2013 pela Editora Escala na página 49, “Saladino era um oficial do exército de um dos senhores da guerra árabe de nome Nur-al-Din da Síria. Começou a destacar-se com uma série de pequenas vitórias táticas sobre os cruzados que, em breve, o impulsionaram para o front das fileiras das forças árabes. Sem dúvida era um líder militar de primeira ordem”, assegura Volkman.
Para entender melhor esta época, na página 48 Volkman explica que “em 1095 a Europa foi subitamente tomada por uma mania religiosa inspirada pelo Papa Urbano II que decretou uma guerra santa contra o islã”. Urbano II imaginava, segundo registros do Vaticano, que a ala oriental da Igreja Católica com sede em Constantinopla, “estava em grave perigo ante uma maré islâmica que já penetrara na maior parte do Oriente Médio e na Ásia Central. Acreditava Urbano que” o objetivo final do islamismo era o de submeter toda a Europa ocidental e destruir a Igreja Católica” assegura Volkman. O poder muçulmano instalado em Jerusalém ameaçava destruir o Santo Sepulcro.
Foi essa percepção que inspirou reis, nobres, senhores de terra e camponeses comuns a doarem muito do que possuíam e alistarem-se em poderosos exércitos para invadir Jerusalém e retomar a cidade santa, sob o julgo do islã, para a Igreja Católica. Essas mobilizações ficaram conhecidas como As Cruzadas (foram oito) e a esses “soldados de Cristo” foi lhes prometido o perdão dos pecados e a salvação eterna como recompensas espirituais por seus serviços. Além disso, o produto dos saques era regiamente dividido de acordo com a importância de cada um. No ano de 1.099 os cruzados tomaram Jerusalém.
Segundo Volkman, na página 49, “os exércitos dos cruzados, reunidos por toda a Europa, marcharam para Constantinopla, depois embarcaram em navios que os levariam à Terra Santa. Marcharam cegamente para o que acreditavam ser uma luta apocalíptica, sem nenhuma ideia real do que havia à frente deles (Essa Cruzada a que se refere Volkman foi a Terceira, sob o papado de Gregório VII e comandada pelo Rei da Inglaterra Ricardo I) tampouco houve quem alertasse para a ideia de realização de reconhecimento de terreno, de avaliação de território ou qualquer tentativa de levantamento de dados ou qualquer inteligência sobre o tamanho e a capacidade das forças militares árabes.
Ainda na página 49 Volkman considera que “do jeito que as coisas aconteceram os cruzados tiveram muita sorte. Embora os árabes estivessem unidos religiosamente sob a bandeira do islã, eram profundamente divididos sob o aspecto político”, como o são ainda hoje.
Segundo Volkman, “as populações árabes residentes consideravam os cruzados apenas como intrusos profanos e entenderam que a libertação só viria quando os fracionados reinos árabes se unissem sob um grande líder”. Finalmente em 1.171 esse grande líder surgiu. Para Volkman era um homem que iria transformar a história e que seus inimigos ocidentais deram-lhe o nome de Saladino. Havia mais de 70 anos que Jerusalém e toda a Costa do Mediterrâneo estavam em poder dos cruzados.
Volkman assegura que Saladino “argumentava incansavelmente que as forças árabes divididas teriam de unir-se para expulsar os cruzados. Esta afirmação ele provou ao comandar vários exércitos árabes, unidos, conduzindo-os para a vitória frente às poderosas forças francas que buscavam expandir o território cruzado na Palestina. O triunfo de Saladino eletrizou o mundo árabe e fez dele o líder supremo do que então se tornou um exército árabe unido”.
A vitória de Saladino sobre os francos foi possibilitada, segundo Volkman por uma extensa operação de espionagem e inteligência: “Saladino fundiu as várias fontes de espionagem dos comandantes árabes e numa operação alastradora transformou milhares de árabes sob a ocupação dos cruzados, em seus olhos e ouvidos.
Percebeu que não poderia depender das informações coletadas pelos serviços de espionagem de cada um dos Kalifas que trabalhavam voltados para os interesses dos chefes e segundo Volkman cada Kalifa direcionava seu KHABAR (chefe de espionagem) a concentrar seus esforços nos inimigos internos, sendo que apenas o Khabar do Kalifa de Bagdá tinha 1.700 mulheres idosas em sua folha de pagamento. “Elas recolhiam toda espécie de boatos, por mais trivial que fosse, com especial atenção a qualquer expressão de deslealdade, mesmo a mais amena delas” descreve Volkman.
Em sua narrativa assegura que os Cruzados não tinham nenhum conhecimento sobre os seus inimigos árabes. Acreditavam na proteção divina e na espada. Enquanto isso Saladino enredava o exercito cruzado numa guerra de guerrilha fornido por informações que vinham desde o verdureiro até as fontes que abasteciam de água o Exército invasor. Conseguiu a preciosa informação de que uma frota de navios desembarcaria em algum lugar com suprimentos para a tropa. Bloqueou esta manobra e não restou ao comandante Ricardo I nada além de negociar. Em troca da retirada do Exército cruzado Saladino permitiu o acesso de peregrinos cristãos à Cidade Santa. Tornou-se Rei de Jerusalém que foi governada pela família até a terceira geração de 1.193 até 1.250.
A grande maioria dos historiadores tratam Saladino com certa indulgencia. Como se ele não fora um feroz matador, guerreiro e impiedoso como todos os outros. Até mesmo o italiano Simon Sebag Montefiore, autor da magnífica biografia sobre Jerusalém lançada no Brasil pela Editora Companhia das Letras em 2013. Na página 337 ele descreve:
-Em dois de Setembro de 1.192 o sultão Saladino e o Rei firmaram o Tratado de Jaffa, a primeira partição da Palestina: o reino cristão ganhou novo impulso com Acre, como capital, enquanto Saladino ficou com Jerusalém, assegurando aos cristãos o pleno acesso ao Santo Sepulcro. O Conselheiro do Rei Hubert Walter discutiu sobre Ricardo I com Saladino, que era de opinião que o Coração de Leão não tinha sabedoria nem moderação. Graças a Walter, Saladino permitiu a volta dos sacerdotes latinos ao Sepulcro.
Saladino não só permitiria a volta dos sacerdotes cristãos como também atendeu a uma reivindicação do Imperador bizantino Isaac Ângelo que exigia o mesmo para os ortodoxos. E Saladino decidiu que uns e outros deveriam partilhar a supervisão do Sepulcro. Após os acordos Saladino e Ricardo I partiram cada um tomando o caminho de volta. Coração de Leão para a Europa e Saladino para Damasco onde morreu aos 54 anos.
É provável que este sábio acordo tenha influenciado a todos que o biografaram. Ainda mais se considerarmos que ou foram judeus ou cristãos, ocidentais, que escreveram sobre ele o farto material que nos chega. Mas não fica a menor dúvida que era um sábio ao administrar a informação, a espionagem, a bisbilhotice, e a política.
É verdade que Saladino e seus descendentes harmonizaram a Palestina por algumas décadas. A condescendência não chega a ser de todo injusta por este gesto.
Mas quem se dedica a estudar e pesquisar esta época percebe muito bem que Saladino apesar de haver imposto derrotas em muitas batalhas travadas com o Exército do Rei Ricardo I este não chegou a ser totalmente vencido. Tanto que o fim das batalhas entre os cruzados e as tropas de Saladino foi um acordo. Mas Ricardo Coração de Leão passou à história como perdedor.
Aleluia, Hildeberto é jornalista
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