por Anna Ramalho
Todo santo dia eu rezo antes de dormir. E todo santo dia eu rezo o Salmo 23: “O Senhor é meu Pastor, nada me faltará…”, ato de fé e confiança em Deus.
Os últimos acontecimentos da desastrada e malcheirosa vida política do Brasil me fazem questionar se não estarei enganada de pastor, com todo o respeito. Certamente Jesus, o Bom Pastor, não merece essa quantidade de “cristãos” obscuros e escusos que circulam com a maior familiaridade e tranquilidade pelos corredores do poder invocando Seu santo nome. Todos com a bíblia numa mão e a sacola de dinheiro ( vale Pix, vale cartão, vale TED) para encherem as burras em nome de Deus.

Essa imagem do inominável com o ministro da Educação (?) dispensa comentários | foto: Pedro Ladeira
Sinto vergonha e asco e me preocupo também: diante dos horrores que temos testemunhado, teria Deus definitivamente deixado de ser brasileiro? Não me espantaria.
E ainda assim, apesar de seu péssimo governo, de seus maus bofes, de sua ignorância, de sua truculência boçal, o inominável ainda conta com 26% das intenções de voto.
Tirem-me daqui!
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Para me poupar, tenho evitado passar os dias assistindo aos noticiários. Estava virando mania e a angústia só crescia. A Ucrânia sendo bombardeada, sofrimento por toda a parte, cenas brutais ao vivo e em cores… Não dá. Há um limite emocional para tanta informação.
Felizmente, adoro um bom filme, uma boa novela, um inexcedível livro – não há prazer que se compare à leitura.
Me dei bem no quesito nos últimos dias.
O livro: comovente, raro, bem escrito, o romance Uma rosa só, da francesa Muriel Barbery, que fiquei conhecendo quando lançou o excepcional A elegância do ouriço. Tendo como cenário Kyoto, no Japão, é uma história de amor entre flores e árvores que se espalham pelos jardins e templos da famosa cidade, magistralmente traduzida por Rosa Freire d’Aguiar, que há mais de 50 anos me dá a honra de ser minha amiga. Recomendo vivamente.
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O filme “No ritmo do coração”, que nos últimos dias virou favorito ao Oscar, é muito bom. Tem uma história curiosa – uma família de surdos com uma filha que não é surda e vira cantora – , desempenhos cativantes, com destaque para o chefe da família, o ator Troy Kutsur, surdo de nascença, que dá um banho de interpretação. Está no Prime Video – e viva o streaming!
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Lícia Manzo é uma senhora novelista: Um lugar ao sol deu gosto de assistir. Tudo de bom
A novela. Gravada inteiramente durante a pandemia e sacrificada pela Globo ( que não contente em estender o BBB, fonte certa de lucro, capar os capítulos e promover descaradamente a próxima novela assinada pela nova direção de dramaturgia), ainda assim, o folhetim de Lícia Manzo marca uma época. Voltaram ao ar a inteligência, a cultura, os diálogos inspirados e inspiradores, os debates antenados e necessários. Foi impecável a direção de Maurício Farias e um deleite raro poder assistir numa mesma novela aos desempenhos inesquecíveis de tantos maravilhosos atores. Um elenco de primeiríssima categoria, no qual destaco Andréa Beltrão, Ana Beatriz Nogueira, Marieta Severo, Denise Fraga, Lara Tremouroux ( a Joy foi uma maravilha!), a bela Alinne Moraes e sua “irmã” Ana Baird, a Nicole, a Regina Braga. Na ala masculina, Cauã foi bem, mas quem arrasou foi o Octávio Muller, que arrancou lágrimas na cena em que fala sobre a filha com síndrome de Down; também brilharam as estrelas de Juan Paiva ( o Ravi), Daniel Dantas como o mau caráter Tulio, o sempre incrível Marco Ricca, o Gabriel Leone, que também sabe cantar, e o José de Abreu, que deu o tom certo ao seu inseguro e torturado Santiago.

Só craques: Zé de Abreu, Marieta Severo, Ana Beatriz Nogueira e Daniel Dantas
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Pra não perder a chance, one more time, #forabolsonaro.