por Reinaldo Paes Barreto
Vejamos, primeiro, as semelhanças (as diferenças vão ficar para o terceiro artigo, sobre o champagne): estruturalmente todos eles são o resultado do “aprisionamento” do vinho ainda em fase de fermentação, com muito gás carbônico, dentro da garrafa. Daí a denominação universal de espumantes, em suas diversas traduções: sparkling, em inglês, cava, em espanhol, sekt, em alemão e mousseux em francês. E champagne, que é um espumante.
Outros pontos em comum: todos são vinhos hospedados em garrafas espessas, por causa da efervescência (a pressão dentro delas atinge níveis de 5 a 6 atmosferas, iguais a um pneu de caminhão) e vedados por rolhas grossas, por sua vez protegidas por gaiolas de arame ou de ferro. E podem ser tomados como um aperitivo — a qualquer hora “normal” — ou para acompanhar entradas como: suchis, sashimis, ostras, caviar, salmão, tartares – e até pratos principais como peixes, frutos do mar, massas leves e aves.
Bom, hoje é a vez do Prosecco.
O Prosecco legítimo é produzido a partir de uma uva só, (varietal) do mesmo nome, originária do Vêneto. É um espumante consumido há muito tempo na Itália, sobretudo em Veneza. Embora a maioria dos verdadeiros Proseccos seja 100% varietal (produzido com a essa única uva, do mesmo nome) a legislação permite a mistura de 15% de outras castas, que podem ser Verdiso, Bianchetta Trevigiana, Perera, Glera Lunga, Chardonnay, Pinot Bianco, Pinot Grigio e Pinot Nero (Pinot Noir).
E, por volta dos anos 80, entrou na lista dos modismos de verão. Começou no terraço do elegante Cipriani (hoje do grupo Belmond) e, claro, rapidamente se espalhou pelos cafés e bares da Praça São Marcos. Servido puro, ou misturado com suco de morango, prosecco con fragola, ou com dois dedos de Aperol e uma casca de limão/laranja na borda, formando o spritz.
É um vinho banal, com honrosas exceções, como o Fae Wisco, o Casa Bianca e outros da região de Valdobbiadene, raros e caros nas prateleiras dos nossos pontos de venda.
Pergunta: então porque cargas d´água ele aterrissou no Brasil e se instalou como sinônimo de espumante? Sendo que já ouvi idiotas chamando Veuve Clicquot de “prosecco francês”!
Jogada de marketing, senhores. E estupenda. Por volta de 1998/99, algum gênio do mercado de vendas de espumantes sacou que estava se aproximando o réveillon do milênio e, obviamente, o preço do champagne, e seus irmãos de bolhas, iria subir para os cornos da lua (expressão das tascas de Lisboa e Porto). E o tal gênio tomou, então, a seguinte providência: abarrotou o mercado brasileiro – e de outros países – de um produto inédito, fácil de memorizar, com preço competitivo, distribuição horizontal e …com “cara de champagne”, porque a rolha voa pelos ares e as bolhas sobem pelas paredes da taça (estou bebendo estrelas, teria dito o monge Don Pérignon quando inventou o champagne, em 1693).
Acertou no milhar. Milhões de garrafas foram vendidas, não só naquele fim de ano, mas até hoje tem o seu mercado, embora enfraquecido pelas centenas de espumantes “inventados”nesses 20 anos.
Bom, o fato é que 2021 está chegando. Desejo a todos um Réveillon restrito – muita gente decidiu passar rigorosamente a sós (*) – com duas, três pessoas ou, no máximo um bem pequeno grupo de familiares/amigos, escoltado por um bom espumante, (se puder um champagne “tant mieux”), para um brinde duplo: o ano que “vai nascer, com muito dinheiro no bolso, saúde (vacina/seringa) pra dar e vender” e o fim desse nefasto 2020.
Que 2021 renove a esperança em nós mesmos, a confiança na ciência — e tenha um gostinho de resgate!
(*) Me contaram que até há alguns anos, as sessões de cinema das 22h do dia 31/12, começavam 15m atrasadas, para terminarem 15m depois da meia-noite e, assim, os muitos sozinhos que iam passar lá o Réveillon não se sentiam mais sozinhos vendo a alegria e abraços da passagem do ano. A conferir.