por Octavio Caruso
É triste acordarmos com notícias ruins. E é mais triste ainda imaginar que muitos da nova geração sequer conhecem o trabalho de Peter O´Toole. Semana passada eu revi três filmes com ele. “Que é Que Há, Gatinha?” (What´s New, Pussycat? – 1965), uma daquelas comédias símbolo dos excessos dos anos 60 e que não fazem o menor sentido. Mas com Peter Sellers, Woody Allen, Romy Schneider (eterna “Sissi”) e Capucine, o tema poderia ser sobre cadarços de sapato, que eu não me importaria. Uma pena que esse título não esteja nas prateleiras para que o público se delicie com ele. Os outros foram “Becket – O Favorito do Rei” e o incomparável “Lawrence da Arábia”, em uma bela versão em Blu-ray. O´Toole será sempre lembrado por sua presença imponente e vulnerável (grande mérito, unir esses dois elementos) nas areias do deserto. David Lean, mestre em obras minimalistas e grandiosas, criou um épico que sobreviveu ao tempo sem nenhum abalo.
Em sua homenagem, irei rever hoje “O Leão no Inverno” e “O Homem de La Mancha”. Essa é a melhor forma de manter esses artistas maravilhosos sempre vivos. E, de certa forma, o cinema é um olimpo de deuses imortais.
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Joan Fontaine também nos deixou nesse final de semana. E grande parte do público jovem, tão desinteressado em apreciar os tesouros do passado, também não a conhece. Eles nunca tiveram o prazer de se encantar com ela no belíssimo “Carta de Uma Desconhecida” (de Max Ophuls), um de meus favoritos.
Louis Jourdan vive Stephan Brand, que no passado havia sido um pianista renomado e muito respeitado na Viena de 1890. Após se envolver com uma mulher casada, tenta fugir da cidade e evitar o marido traído que o havia desafiado para um duelo. Porém antes de realizar seu intento, recebe de seu empregado uma carta que havia acabado de chegar. A carta fora escrita por uma jovem chamada Lisa (Joan Fontaine), de quem ele não guarda nenhuma lembrança. O seu relato provoca a chocante revelação de fatos que até então eram desconhecidos e que terão graves consequências sobre seu destino.
O diretor cria uma obra romântica ao som de Liszt, Mozart e Wagner, tão sensível que consegue deixar ao final um sentimento de melancolia no público, tão grande quanto o de seu trágico protagonista. Ele pinta para nós em flashback o retrato perfeito daquela jovem apaixonada, que via em Brand o seu amor inalcançável. Sua admiração pelo fato dele ser um pianista famoso e requisitado, o encanto que a sua música provocava naquela jovem humilde que ele sequer sabia o nome. A beleza da fotografia do ótimo Franz Planer demonstra que o puro brilhantismo se encontra nas sutilezas, nas sombras bem colocadas. Com o posicionamento de câmera perfeito de Ophuls, criam cenas que são verdadeiras pinturas emolduradas. A história simples e a maneira genial como é contada são os motivos que fazem de “Carta de uma Desconhecida” o meu filme favorito do diretor alemão.
Adoro a presença dela em “Alma Sem Pudor” (de Nicholas Ray), ainda que a maioria se lembre dela em “Rebecca – A Mulher Inesquecível”, única vez que Alfred Hitchcock recebeu um Oscar de Melhor Filme, pela obra que menos carrega sua assinatura.
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Conselho aos jovens: busquem valorizar os artistas que revolucionaram o mundo antes de seu nascimento. Não se atenham à mediocridade do mundo moderno. Entendam o ontem, para poderem aproveitar melhor o hoje. Cultura não pesa na mente, não é um fardo. Ensinem isso aos seus filhos, apresentem os clássicos para as namoradas e amigos. Não percam tempo precioso com entretenimento raso. A vida é curta, mas sabendo utilizar bem o tempo, dá para conquistarmos bastante coisa.
Octavio Caruso – Ator, Escritor e Crítico de Cinema
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