por Murilo Rocha
Há muito reflito sobre a incrível sucessão de palavras que a internet nos obriga a incluir no vocabulário – todas em inglês ou derivadas dele – uma das quais me chama particularmente a atenção: o(a) influencer. Ou, no velho e bom português, o influenciador digital. Isto é, um novo nome para o líder de antigamente aquela pessoa, em geral talentosa, capaz de atrair multidões para o que diga ou faça, um quadro amplíssimo, que vai da política à música popular, embora raramente passe pela ciência profunda,, pela grande arte, pela alta cultura em geral.
O problema é que essa gente – quase sempre jovens – trata de banalidades e, principalmente, de propagar maledicências, intrigas e mensagens destruidoras de reputações e carreiras. Às vezes – poucas vezes para o volume de mensagens – aparece algo inteligente, útil, espirituoso e enriquecedor do pensamento e dos sentidos. Já foi repetida à exaustão mas, passadas duas décadas, ainda não apareceu frase melhor neste século que a do professor e cientista social Umberto Eco: A internet deu voz aos imbecis. E, como os coelhos, eles se reproduzem com incrível facilidade. Já soube de inúmeros desses limitados intelectualmente que alardeiam ter milhões de seguidores de seus “pensamentos” e atitudes. E a cada dia conseguem arregimentar mais, seja qual for o tipo de tema de que tratem. Me vem logo à memória a história do Flautista de Hamelin, dos contos dos Irmãos Grimm de minha infância. Quem não conhece, melhor ir ao Google.
Outra praga moderna, e que nada tem a ver com internet, é no jornalismo. E me traz à lembrança a mais que conhecida frase do mestre Nelson Rodrigues – que raros influencers também sabem quem é, sem ir ao mesmo Google. Perguntado, uma vez, sobre que recomendação faria aos jovens aspirantes à carreira, ele foi direto: envelheçam. O problema é que as TVs, especialmente as “all news”, por diferentes razões, ignoraram, há tempos, o sábio conselho. E, de repente, encheram suas telas com belas moças e simpáticos rapazes fazendo o papel de correspondentes no exterior, mas sem a maturidade necessária a essa função tão exigente. Que pressupõe, basicamente, experiência, ampla cultura geral, vivência em política e conhecimento de História – algo raramente encontrável na maioria dos jornalistas de hoje.
Além disso, certamente por razões econômicas, os economistas que tocam hoje as empresas jornalísticas limitaram drasticamente a quantidade de correspondentes. O que nos obriga a ver nas telas um desses meninos(as) falando de Nova York, Londres ou Paris, os restantes centros mundiais de difusão jornalística, sobre um fato ocorrido na Austrália, no Curdistão, em Burkina Faso ou na Bielorrúsia. É claro que a extraordinária expansão das comunicações – e aí voltamos à onipresente internet – torna muito mais fácil esse tipo de obtenção de informações em escala planetária. Mas, e a análise, o tal contexto do fato narrado, quase sempre ignorado ou, quando não, tratado com a superficialidade dos pouco vividos?
Em tempos há muito idos, os jornais (impressos em extinção acelerada) mantinham correspondentes no exterior por uma questão de prestígio. Em minha época na Editoria Internacional do Globo, havia profissionais em NY, Washington, Paris, Roma, Londres, Lisboa, Tel Aviv e até Buenos Aires. Gente qualificada, razoavelmente bem paga, pronta até para se deslocar a outros lugares, caso necessário. Hoje, restam poucos e são como os citados acima: de um ou dois grandes centros, focados na internet o tempo todo para acompanhar o que aconteça de interessante do outro lado do mundo e, rapidamente, transmitir para a sede. Com os resultados óbvios: uma avalanche de notícias soterrando as análises, essenciais para a melhor compreensão dos temas. O resultado é a superficialidade, que se irradia com a velocidade de um coronavírus, e vai contaminando a qualidade do conhecimento.
Antes que me acusem de fossilização, é bom lembrar que, embora fora das redações há muitos anos, não deixo de me atualizar minimamente com as novas tecnologias e seus efeitos sobre nossa vida em sociedade, para o bem ou para o mal. Mas não consigo vencer a nostalgia que me acossa toda vez que abro o jornal (ainda), vejo televisão ou me posto diante da telinha do IPad e, da menor ainda, telinha do celular. Dá uma tristeza…