por Rafael Fonseca
AMSTERDAM. A capital mais interessante da Europa deu um salto qualitativo imenso desde que reduziu o uso de maconha por estrangeiros. Agora só é permitido o consumo da erva nos Cofeeshops pelos próprios holandeses. A última vez que eu havia estado lá, no ano passado, era aquele cenário: uma garotada super doidona, principalmente norte-americanos e brazucas, mijando nas ruas em qualquer lugar, quebrando garrafas, e de manhã você tinha aquela cidade linda totalmente imunda. Uma pena o retrocesso, uma vez que todo mundo deveria ser livre pra escolher o que põe pra dentro, mas a cidade ganhou — e muito — com a redução do consumo.
RONDA NOTURNA. Outro barato, esse muito mais refinado, é o re-inaugurado Rijksmuseum, o Museu Nacional deles. Verdade que o Rembrandt mais famoso, a Ronda Noturna, e os 4 Vermeer do acervo sempre estiveram lá numa pequena seção que nunca fechou. Mas passear pelo imponente edifício é uma delícia. Minha única dúvida fica por conta do tamanho: esses museus enoooormes, a la Louvre, cansam a beleza, literalmente. Tem uma hora que o 358º renascentista italiano já não te diz mais nada.
BANHEIRÃO. Re-aberto também o Stedelijk, Museu de arte contemporânea. Acoplaram ao prédio do século XIX um imenso anexo ultra moderno, que de longe parece uma gigantesca banheira suspensa no ar. É imperdível.
FORNO E FOGÃO. Agora, o que me impressionou mesmo foi a quantidade de bons restaurantes na cidade. Barbaridade! Deixo a dica, aqui, de pelo menos 5 lugares excepcionais. O primeiro, onde comi divinamente, é o Ciel Bleu, no alto de uma torre na parte nova da cidade, no Hotel Okura. A começar pela vista, que é espetacular. Peça o que quiser, mas não negue os carrinhos de queijo e depois o de café. Nem precisa de sobremesa: o carrinho de café vem com tantos mini-docinhos, cada um mais bonito e delicioso que o outro. E não pule o carrinho de queijo, se você gosta da iguaria. É de aceder ao paraíso.
NA INTIMIDADE DO CHEF. Minha segunda dica é pegar um carro ou trem e partir para Zwolle. A cidadezinha é engraçadinha, mas nada demais. Uma hora e pouco de distância (como ir de Copacabana à Barra). Porém lá está o De Librije (pronuncia-se Librráie), estrelado Michelin que também consta na lista San Pellegrino como um dos melhores do mundo. Se você fizer reserva com antecedência, vai poder, como meu grupo fez, comer na cozinha, na mesa do chef. É isso mesmo, literalmente. Você entra pela porta da frente, deixa o ambiente sisudo do restaurante por uma escada e desce até a cozinha. No meio da rapaziada montando e finalizando os pratos, o chef Jonnie Bouer te recebe na maior simpatia. E come-se divinamente.
NA BORDA D’ÁGUA. Outro estrelado Michelin é o Bord’Eau, e como o nome já diz, fica à beira de um canal, no Hotel De L’Europe (onde estávamos). Comida excelente, mas a equipe parece meio perdida e o sistema de reservas deixa a desejar. Mas estando no centro histórico é a opção pra quem quer comer bem.
VOX POPULI. Se você não está afim de gastar os tubos e nem acha restaurante um programa que precisa dessas estrelas todas, o italiano Bussia é uma ótima pedida. Ambiente descolado, comida ótima. Agora a delícia máxima mesmo são os croquetes, especialidades dos holandeses. Os melhores e mais famosos croquetes são fornecidos pelo fabricante Van Dobben, que está em todas, inclusive em máquinas de croquetes e sandubas expressos espalhadas pela cidade, mas a graça é ir na lojinha original, veja aqui.
INFORMAÇÃO DE COXIA. Os croquetes do Van Dobben são famosíssimos. Mas o melhor deles, mesmo, é feito pelo Holtkamp, que fornece para os cafés mais bacanas da cidade. Então vá ao Holtkampf original, uma lojinha de doces. Aí você entra e se pergunta, em meio a todo aquele açúcar, aos doces confeitados com esmero, onde raios estariam croquetes aqui? É que, como eu disse, eles fornecem a outros lugares, mas se você pedir eles fritam na hora. Como dieta se faz e casa, você vai pedir 3, o de queijo, o de camarão e o de carne. (Escrevo e vou salivando, com a lembrança). Como não é um bar, nem bebida eles vendem. Problema zero, você pega sua caixinha com os 3 croquetes, senta-se no bar do lado, pede uma cerveja holandesa e engorda umas 400 gramas, entope suas veias de colesterol, mas sente um prazer inenarrável.
VOX DEI. E você não pode sair de Amsterdam, a não ser que seja fã irremediável da Daniela Mercure ou do Belo, sem ir a um concerto na Concertgebouw. A sala é do final do século XIX, época na qual inexistia as ciências da engenharia acústica. Mas mesmo assim eles conseguiram construir a melhor sala de concertos do planeta em termos de sonoridade, insuperável até hoje. E não é à toa que ela abriga a melhor orquestra da Terra, que já supera as Filarmônicas de Berlim ou Viena, graças ao trabalho magistral do maestro letão Mariss Jansons. Se você conseguir ingressos para ver essa orquestra da casa, a Concertgebouworkest, regida pelo Jansons, e pegar lugares atrás do coro, de onde você vai ver o regente de frente (como vêem os músicos), será uma experiência para não esquecer nunca mais…
RAFAEL FONSECA
é pesquisador musical, cronista da Anna e organiza viagens musicais.