por Olga de Mello
Erotismo na literatura existe desde que a Humanidade começou a escrever. Alguns são poéticos como o Cântico dos Cânticos, atribuído ao rei judeu Salomão, e mantido na Bíblia dos cristãos dentro do Antigo Testamento. Outros se detiveram em aspectos técnicos da sedução e do sexo, como o indiano Kama Sutra. Há ainda os que ousaram descrições realistas carregadas de humor pesado, como o Decamerão, de Boccacio, que marca a transição da literatura ocidental para o realismo, rompendo com o moralismo medieval.
Romper com o tabu da sexualidade explícita garantiu ao inglês D. H. Lawrence, em 1928 com O Amante de Lady Chatterley, sua posição ao lado dos chamados escritores libertinos da França do fim do século XVIII, como Restif de La Bretonne, Chordelos de Laclos e o Marquês de Sade. No século XX, o americano Henry Miller segue o estilo naturalista de Lawrence, na descrição da vida sexual de seus personagens ou em seus relatos autobiográficos, abrindo caminho para o conterrâneo Charles Buckowski. A diferença desses autores para os que produziam pornografia pura e simples não apenas no talento estilístico, mas no aproveitamento do tema para marcar a derrubada de tabus sociais, refletindo o momento político que viviam.
Apesar de raras mulheres figurarem entre os autores de literatura erótica, como Anaís Nin (ex-amante de Henry Miller), sexo é elemento importante nas tramas românticas dos romances destinados ao público feminino. Os “livrinhos de banca de jornal” das coleções “Júlia” ou “Sabrina” sempre apresentaram cenas apimentadas dos encontros amorosos, que chegaram à chick lit, o gênero que nasceu nos anos 1990, revelando escritoras como Helen Fielding (O Diário de Bridget Jones) e Marian Keyes (Melancia).
A trilogia iniciada por Cinquenta tons de cinza (Intrínseca, R$ 39,90) segue rigorosamente a fórmula dos romances rosa e consagrou um novo nicho literário, o chamado mom porn. No mundo inteiro, os três livros já venderam quase 50 milhões de cópias, o que levou as mais sisudas editoras a correrem em busca de autoras que descrevam sexo explicitamente, mas com altas doses de romantismo em tramas que oscilam entre o ingênuo e o tedioso. No Brasil, o primeiro volume da série já vendeu 300 mil exemplares.
Acaba de chegar às livrarias Cinquenta tons mais escuros (Intrínseca, R$ 39,90) – que teve pré-venda de 50 mil exemplares -, trazendo o reencontro dos protagonistas, Ana e Christian, e suas práticas de sexo levemente sadomasoquista. A fórmula da inglesa E.L.James é relatar os animados encontros da dupla em belos cenários românticos, entremeados por momentos de discórdia, geralmente por ciúmes infundados de um ou de outro, com o herói milionário, sempre “exalando sua sensualidade embriagante” ou suspirando “involuntariamente” ante a “audácia inesperada” da mocinha. A adjetivação é muito semelhante à utilizada por Judith McNaught em Agora e Sempre (Bestbolso, R$ 19,90), que traz os elementos típicos do folhetim para mulheres: uma bela órfã é acolhida por um primo mais velho, misterioso e com forte poder de sedução. O romance se passa em 1815, mas poderia ser adaptado para a atualidade.
Se a inconsistência dos personagens é a grande falha da mom porn, perversões com as mais reles explicações freudianas foram reunidas pela americana Laura Reeves no thriller Falsa Submissão (Record, R$ 39,90). A coletânea de situações sadomasoquistas que beiram a repugnância são superadas pelo leitor devido à curiosidade em saber quem é o assassino da irmã da heroína, que tem um caso com o principal suspeito, um esquisitão bonito, inteligente e rico. Para quem se interessa pelo gênero, uma boa pedida pode ser a desconstrução dos contos de fada da veteraníssima Anne Rice, que recriou a lenda da Bela Adormecida. Em Os desejos da Bela Adormecida, A punição da Bela e A libertação da Bela (Rocco, cada um a R$ 29,50), a princesa desperta de um sono de 100 anos para tornar-se escrava sexual do príncipe, submetendo-se a diferentes práticas sexuais com diversos parceiros.
Olga de Mello é Jornalista, carioca, escreve para sites, jornais e revistas principalmente sobre cultura, que considera gênero de primeira necessidade.
Blogs: www.arenascariocas.blogspot.com e estantescariocas.wordpress.com