por Olga de Mello
Quase 200 anos após a morte de Jane Austen, a escritora permanece como uma das autoras mais populares da atualidade. O que explica o sucesso de sua pequena obra – seis romances que falam de jovens casadoiras na Inglaterra pré-vitoriana? O estilo é requintado para os leitores de hoje, que estranhariam o vocabulário rebuscado e a ironia da arguta observadora social, que, para alguns críticos, entronizou, através da literatura, os valores imperialistas britânicos – já que muitos dos aristocratas rurais criados por Austen viviam dos dividendos obtidos com a opressão e a escravidão na América, Ásia ou África.
A primeira vez em que li Orgulho e Preconceito (Bestbolso, R$ 19,90), aos 12 anos, fiquei revoltada com a pasmaceira daquelas mocinhas que esperavam um marido rico para sustentá-las, já que não herdariam títulos ou propriedades do pai. Tive raiva do arrogante Mr. Darcy e me faltava maturidade para compreender as algemas sociais que impediam as mocinhas de buscarem um trabalho – algo comparável a uma jovem de alta classe média no Brasil tornar-se empregada doméstica. Não sabia, então, que eu encontrara um dos pontos mais interessantes da obra de Jane Austen – a visão da condição feminina de seu tempo, algo que ela mesma desafiou ao sustentar-se com a literatura, morrendo solteira, aos 41 anos, em 1817. Na releitura, ela me conquistou e não apenas pelos aspectos sociais, mas, principalmente, pelo encadeamento de situações descritas de maneira mordaz e, muitas vezes, envolvendo personagens multifacetados. Ao lado dos intrometidos, indiscretos e falastrões, as heroínas têm defeitos e qualidades, mostrando insegurança e reagindo impensadamente – como mulheres no mundo real.
A atual Austenmania começou em 1995, com a minissérie da TV inglesa Orgulho e Preconceito. Na pele do esnobe Mr. Darcy, Colin Firth inspirou Helen Fielding a criar seu xará contemporâneo em O Diário de Bridget Jones (BestBolso R$ 19,90), um sucesso estrondoso no mundo inteiro, e o primeiro marco de um novo gênero, o chick lit – a literatura de entretenimento romântica, divertida e voltada para o público feminino. As aventuras da trintona solteira nada mais são do que uma adaptação moderna de Orgulho e Preconceito.
Sempre impulsionada por produções cinematográficas como Emma, Orgulho e Preconceito, Razão e Sensibilidade e Persuasão, a moda Jane Austen só fez aumentar na virada do milênio. O próprio nome da escritora tornou-se chamariz de livros que procuravam manter a aura romântica de suas criações, como Eu fui a melhor amiga de Jane Austen (Rocco, R$ 35), de Cora Harrison, uma interessante trama para meninas, envolvendo a escritora e uma prima – personagem real – de quem foi muito próxima. Ela também é invocada na amizade entre duas mulheres para discutir o choque cultural Ocidente e Oriente Médio em Conversas sobre Jane Austen em Bagdá (Reler, R$ 48), de Bee Rowlatt e May Witwit. Já Aprendi com Jane Austen – Como seis romances me ensinaram sobre amor, amizade e as coisas que realmente importam (Rocco, R$ 34,90), de William Deresewiecz, afirma que a literatura pode influenciar – e melhorar – a vida dos leitores.
A onda literária gótica atual não poderia deixar de aproveitar a escritora como personagem – embora ela tenha ridicularizado o gênero em A Abadia de Northanger (BestBolso, R$ 19,90). Jane Austen, a vampira (Lua de Papel, R$ 39,90), de Thomas Michael Ford, traz a escritora como uma morta-viva que virou livreira nos Estados Unidos. Razão e Sensibilidade e Monstros Marinhos (Intrínseca, R$ 29,90), de Ben H. Winters, tem homens polvos entre os pretendentes das mocinhas de Austen. As irmãs Bennet de Orgulho e Preconceito (BestBolso, R$ 19,90) caçam mortos-vivos em Orgulho e Preconceito e Zumbis (Intrínseca, R$ 29,90), de Seth Grahame-Smith.
Entre tantos títulos que apresentam sequências das histórias de Jane Austen, a veterana P.D. James, aos 90 anos, lançou no fim de 2011, Death comes to Pemberley (A morte chega a Pemberley – ainda não lançado no Brasil, com personagens e cenários de Orgulho e Preconceito). A diferença das outras criações neo-austianas é que P.D. James copia o estilo de escrever de Austen, um exercício literário fácil para quem domina a arte do suspense. Aprendi com Jane Austen – Como seis romances me ensinaram sobre amor, amizade e as coisas que realmente importam (Rocco, R$ 34,90), de William Deresewiecz, afirma que a obra da escritora pode influenciar – e melhorar – a vida dos leitores. Para descobrir se a tese é verdadeira ou por que Jane Austen agrada a multidões na Era da Internet, nada como tirar a prova lendo suas deliciosas criações.
Olga de Mello é Jornalista, carioca, escreve para sites, jornais e revistas principalmente sobre cultura, que considera gênero de primeira necessidade.
Blogs: www.arenascariocas.blogspot.com e estantescariocas.wordpress.com