por Anna Ramalho
Diferente que sou em tudo e por tudo das excelências do Supremo, afeita que sou aos detalhes técnicos que regem o nosso cotidiano de cidadãos comuns, fico aqui me perguntando a troco do quê exatamente essas criaturas togadas, além de perceberem salários altíssimos, têm direito a dois meses de férias, Semana Santa de 20 dias, Finados de uma semana e por aí vai a alegre farândola. E nós pagando, claro. Pagando e trabalhando. Pagando e cumprindo cada um de nós a sua jornada de trabalho. Sem mordomia alguma porque trabalhador não conta com mordomia. Quem consegue um trabalho hoje – neste Brasil de 13 milhões de desempregados, de engenheiros pilotando Uber e arquitetas vendendo quentinha – quer apenas o que lhe é de direito: salário em dia, férias, 13º, tíquete-refeição, vale-transporte, essas coisas que cheiram a pobreza para esses senhores togados do palavrório escorreito.
Não consegui assistir ontem àquela sessão do STF. Quando percebi que os 10 minutos de intervalo para o cafezinho da moçada tinha se esgotado, que já passava de 20 minutos a enrolação da apresentadora da TV, logo pressenti que mais uma palhaçada estava a caminho. Não deu outra.
Fica a impressão de que a mais alta corte do país está andando na cabeça de cada brasileiro. Solenemente.
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Estamos às vésperas da Semana Santa, que, para nós, pobres mortais, começa na quinta-feira da semana que vem. Para quem crê, como eu, é tempo de recolhimento, de jejum e abstinência de carne. Tempo de panos roxos cobrindo os santos, de velar o Senhor Morto, e rezar muito, enquanto esperamos pelo domingo da Páscoa, da Ressurreição de Cristo, a mais importante festa da minha Igreja.
Depois daquela palhaçada de ontem, fiquei com a certeza de que a Paixão, o sacrifício pascal ficam com Jesus Cristo, como sempre. A agonia, o peso da cruz, o martírio, a crucificação. Sempre com Ele.
Lula da Silva – cujos Pilatos de algibeira nunca decepcionam – livre, leve e solto, pode reunir filhos e netos para uma ruidosa caça aos ovos no sítio de Atibaia, né, não?
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Esse STF me mata de vergonha. Fico imaginando a imagem do Brasil pelo mundo quando na internet bomba e repercute aquela discussão de quinta entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Ainda que entrando na baixaria, o ministro Barroso lavou a alma dos brasileiros que, como eu, enxergam em Gilmar Mendes a figura de um ser oportunista, de língua frouxa, de maus bofes. Como diria minha avó, Gilmar Mendes não tomou chá na infância. Sua falta de modos incomoda. Sua arrogância ofende. Seus métodos apavoram. #foragilmarmendes.
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Mais uma vez invoco a memória de meu bisavô Capistrano de Abreu: o problema no Brasil é a falta de vergonha. Como ele sugeriu, ainda no início do século passado, a Constituição do Brasil deveria ter um único parágrafo: “Todo brasileiro é obrigado a ter vergonha na cara. Revogam-se as disposições em contrário.”
Como todos os brasileiros puderam constatar ontem, vergonha na cara é artigo em extinção na nossa Pátria Mãe gentil.
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Quem matou Marielle Franco e Anderson Gomes? Passaram-se 9 dias da execução e, até agora, nada.
Essa pergunta não pode ficar sem resposta.