por Bruno Cavalcanti
Anunciada nesta semana, a possível parceria entre Anitta e Madonna fez tremer as estruturas do mercado da música pop nacional. Muito porque é a primeira vez que Madonna divide uma música com um artista brasileiro – até então, sua única parceria com uma figura patropi foi com o artista gráfico Giovanni Bianco; Muito também pelo fato de os puristas de plantão terem torcido o nariz para a conquista da diva do pop-funk tupiniquim.
Mas a verdade é uma só: desde que surgiu, há cinco anos, com o hit instantâneo Show das Poderosas, a carioca Anitta cresceu vertiginosamente e passou a dominar o mercado com uma estratégia de marketing agressiva, que, guardadas as devidas proporções, é comparável apenas ao trabalho de Marisa Monte, que desenvolveu uma estratégia similar, porém mais lânguida, ao longo de quase 30 anos de carreira.
Caso a anunciada parceria de fato se concretize, Anitta conseguirá a coroação no mercado pop internacional, aonde vem tentando se notabilizar com força desde o começo deste ano de 2018, quando lançou parceria com a rapper americana Iggy Azalea e cantou no The Tonight Show, programa do comediante Jommy Fallow, e uma das maiores audiências da rede NBC.
A chancela de Madonna é obviamente rentável para qualquer jovem artista que esteja tentando adentrar as rádios norte americanas – embora não seja indispensável. Para Anitta, é um nome de peso no currículo, e a possibilidade de ter um crescimento substancial na visibilidade mundo afora, resultando, possivelmente, em sua notabilidade como a primeira cantora pop de língua portuguesa a fazer sucesso nos Estados Unidos.
O que reflete positivamente também para o Brasil, que nunca teve uma cantora do mercado pop com a alcunha de sucesso internacional. Que pese o sucesso de cantoras como Carmen Miranda, Astrud Gilberto, Virgínia Rodrigues e Bebel Gilberto nos Estados Unidos e no resto do mundo, Anitta representa uma música globalizada que não se tornou produto de exportação no Brasil.
Ao ter a figura da carioca internacionalizada, será possível também um upgrade cultural do Brasil, que ainda (sobre)vive da imagem criada pela música de João Gilberto, Antônio Carlos Jobim e, a nível folclórico, da supracitada Carmen Miranda, mantendo-se fora da bolsa de valores do pop, e escamotear artistas do quilate de Ivete Sangalo e Daniela Mercury (duas possíveis expoentes deste gênero) a plateias formadas unicamente por colônias de brasileiros e um ou outro curioso.
Por fim, Madonna também pode se beneficiar da parceria com a cantora, explorando o que há de mais inédito em sua música: o funk, que jamais adentrou o repertório global, senão de forma tão folclórica quanto “os quindins de iá iá” na década de 1940.
A rainha do pop pode mostrar, mais uma vez, que está um passo a frente de toda a roda viva do mercado, entendendo o funk carioca como um desdobramento contemporâneo do som produzido por James Brown, fonte da qual bebeu ao se inspirar na composição de discos como Madonna (1983), Erotica (1992) e Bedtime Stories (1994).
A cantora também já se notabilizou por seu “efeito Madonna”, no qual descobria talentos e os exportava mundo afora. Foram os casos de nomes como o músico de R&B Babyface, os produtores William Orbit e Mirwaïs e a rapper inglesa M.I.A. Madonna chegou a avalizar mesmo a carreira de sua maior rival, Lady Gaga.
Mas, com o passar dos últimos anos, apenas se ajustou a pegar carona com alguns nomes já consolidados, como os produtores Pharrell Williams, Timbaland e Justin Timberlake, em um disco tão irregular que acabou por se tornar uma das pedras menos fundamentais de sua discografia (Hard Candy, 2008).
Entretanto, este novo disco promete ser uma espécie de quebra de paradigmas dentro da carreira da própria rainha do pop, e a participação de Anitta pode significar a globalização desenfreada, tanto do som de uma Madonna que voltou a abrir os ouvidos para o que acontece mundo afora, quanto da carreira de um jovem ícone pop que, queiram os puristas ou não, pode vir a ser a perfeita tradução internacional da música brasileira. Quem viver…