por Gilda Mattoso
Uma das melhores coisas que aconteceram em minha vida profissional e pessoal foi ter conhecido e colaborado por muito tempo com Caetano Veloso. Além do talento conhecido por todos, Caetano une inteligência e humor bem dosados o que faz dele uma pessoa deliciosa de se conviver e trabalhar. Fica até difícil, pois tudo que pedem a ele parece tolo diante da grandeza de sua inteligência e sutileza de seu senso de humor. Demos muitas risadas juntos e compartilhamos momentos mágicos de sua carreira e de sua vida, da vida de nossos filhos, amicíssimos, fizemos imensas viagens juntos e conhecemos grandes personalidades do mundo juntos.
Um dos momentos mais incríveis dessa trajetória foi quando, em Setembro de 2001 , Caetano foi agraciado com o Prêmio Michelangelo Antonioni, dado por um conselho de notáveis de diversas áreas da cultura na Itália e no mundo. Caetano, fã declarado do cinema italiano, especialmente de Fellini e Antonioni, havia composto a canção Michelangelo Antonioni, cuja letra é como um filme do próprio e diz:….¨Visione del silenzio/Angolo vuoto/Pagina senza parola/Una lettera scritta sopra un viso/Di pietra e vapore/Amore/Inutile finestra¨
Enfim rumamos para Assis onde haveria um show de Caetano com a entrega do prêmio feita pelo próprio Antonioni, que tem casa de campo em Trevi, bem perto de Assis. Na véspera do prêmio, Enrica e Michelangelo ofereceram um almoço para Caetano e também para comemorar os 89 anos. Era dia 29/9 e foi um almoço maravilhoso na casa deles (hoje transformada num spa de luxo) e lá conhecemos ainda Tonino Guerra, roteirista top do bom cinema italiano. Estava também nossa amiga, Fiorella Amico, montadora de cinema e viúva do também cineasta Gianni Amico, e outras pessoas igualmente interessantes. Pois bem, na hora do show, Caetano apresentou pela primeira vez a canção que fizera dedicada ao cineasta que chorou copiosamente ao ouvir a linda música. Antonioni estava já combalido por um derrame que lhe limitara os movimentos e, sobretudo, a fala. Na hora do prêmio quando o cineasta deveria subir ao palco para a entrega a Caetano, este não deixou que ele se levantasse, desceu até a plateia onde estavam Michelangelo e Enrica e, ajoelhado, recebeu das mãos trêmulas do cineasta o lindo troféu desenhado por Sol Lewitt, membro do conselho que concede o prêmio. Poucas vezes vi Caetano tão emocionado.
Custo a crer que o menino, cujos caracóis nos cabelos deram lugar a uma linda cabeleira grisalha, esteja completando 70 anos de vida e só posso desejar a ele longa vida e que continue a nos brindar com sua música única, rica, doce, forte, gostosa…. tudo de bom!
P. S. Vejam e ouçam Caetano cantando Michelangelo Antonioni, graças ao You Tube.
Gilda Mattoso