Fui parar em Copacabana, sexta-feira passada, debaixo de um calor e de um sol que queima de um jeito que não fazia em todos os anos que ali morei, nos doces anos da infância e na época das descobertas da adolescência, quando o tal do efeito estufa nem sonhava em fazer parte do noticiário, que hoje não para de nos dar conta das perversidades da La Niña mundo afora.
É uma saudade boa que eu sinto a cada vez que vou a Copacabana – ainda que a Princesinha do Mar já não seja mais aquela. Nada mais é como antes, claro. Nem Copa, nem eu. E a nostalgia me acompanha no passeio..
Desta vez não estive na Rua Dias da Rocha, onde morei até me casar, e que era desde então uma das mais arborizadas e agradáveis ruas do bairro. Tinha na sua esquina a Casa Polar, a sapataria de fé de homens, mulheres e crianças, com uma vitrine que dobrava a esquina e reproduzia o Polo Norte e, dentro dela, um enorme urso para sublinhar o clima glacial. Anos depois, neste capítulo sapato, a Polar já não servia mais para a mocinha que queria as sapatilhas da Bercyl, ali na Xavier da Silveira, ou os Chanel sob medida feitos pelo Bellini, ele mesmo, o lindo Capitão da Copa de 1958. No Centro Comercial de Copacabana onde ficava a loja do jogador, também tinha loja o Seu Antônio das sandálias de verão.
Tudo isso sumiu, claro. O Centro Comercial continua lá, mas com um comércio pra lá de furreca. É sentindo a falta das muitas casas importantes que Copacabana abrigou que se sente mais profundamente a deterioração do bairro. Copacabana é, hoje, uma espécie de Saara com mar. Alinham-se lado a lado cadeias de sapatarias populares, uma quantidade incontável de farmácias e drogarias, restaurantes a quilo, bancos e mais bancos, lojinhas menores que vendem toda a sorte de badalhocas, noves fora os camelôs para todos os gostos.
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Desci a Rua Raimundo Correia. Nos tempos de glória, suas duas esquinas com a Avenida Nossa Senhora de Copacabana eram ocupadas, de um lado, pela Casa Sloper, e, do outro, pela chiquérrima Nuance, que tinha ( e tem ainda, mas no Leblon), os mais lindos e caros tecidos. Chiquérrima. Hoje, de um lado, está uma livraria Siciliano, do outro, uma imensa Drogaria Onofre. A Siciliano já tinha visto muitas vezes, mas a falta da Nuance foi novidade. E incomodou. Como incomoda até hoje a Confeitaria Colombo que virou mega-agência do Banco do Brasil.
Como diria mamãe – que batia todas aquelas ruas na maior alegria – “abastardaram” Copacabana.
Ali naquele pequeno trecho que andei, havia o Rei da Voz, que Abrahão Medina lançou como dos primeiros patrocinadores da televisão que nascia – como mais tarde fez com a Casa Garson, que também sumiu. Hoje está lá o Ricardo. A loja, não o bofe hipotético daquela madame que acabou de entrar na C&A para comprar um biquini. A C&A está plantada onde ficava o Metro Copacabana, o cinema que tinha o melhor ar condicionado da cidade. Naquela época, quando um aparelho de ar condicionado era raridade, todo mundo parava em frente ao Metro pra tomar “aquele ventinho”. E aproveitar para comer um espetinho de uvas caramelizadas que o vendedor tirava de sua pesada e elegante caixa de madeira escura e vidro. Logo adiante, depois da Rua Santa Clara, mas ainda na Avenida Copacabana, a joalheria Krause exibia pérolas, brilhantes, prataria, sem que seus donos sonhassem com assalto. Foi-se embora também há anos a Barbosa Freitas, uma espécie de C&A da época, um tanto mais sofisticada, onde mamãe comprava nossos presentes de Natal.
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Do meu tempo, continuam ali a Cirandinha, lanchonete que tinha um sundae Copacabana inesquecível, a Flora Santa Clara, a Tonicha, o Bicho da Seda e a Motex, de sapatos para homem. Nada mais. Ou pouco mais do que isso. Me dá um aperto no coração! Terminei meu tour hoje evocando o grande Drummond, que também em Copa morou, na Rua Conselheiro Lafayette. O poeta escreveu sobre sua terra natal: “hoje Itabira é um retrato na parede. Mas como doi.”
Voltei para o Jardim Botânico. Nem retrato de Copa tenho na parede. Restou a saudade.