por Rafael Fonseca
Recentemente esta coluna publicou excelente artigo sobre Barcelona, de João Victorino. Não que eu queira chover no molhado, mas meu intuito é mostrar uma outra Barcelona, talvez para aqueles que já a conheçam bem e queiram provar da cidade do ponto-de-vista catalão: um roteiro menos turístico, assim digamos. Tive a sorte de ter estado na capital catalã várias vezes, e tenho ali um amigo que me mostrou a Barcelona e arredores com a qual me fascinei e para onde levei nestes últimos dias um grupo para uma série de concertos de Beethoven, no famoso Palau de la Música e no moderníssimo Auditori.
Começo pela gastronomia, mais avançada aqui que em qualquer lugar do mundo. Além do 7 Portes já citado no artigo de Victorino, onde se come a melhor Paella da cidade (nada daquela coisa amarelo-manga de açafrão em pó — a paella ali é original, escura, do caldo das carnes e mariscos), quem quiser provar as melhores tapas da cidade atravesse a Barceloneta e vá ao Arola (Carrer de la Marina, 19, telefone +34 932 21 10 00) com um menu-degustação de comer de joelhos. Outras tapas imperdíveis no Passadis del Pep (Pla de Palau, 2, telefone +34 933 10 10 21) que só os locais conhecem: trata-se de um “anexo” do famoso restaurante Cal Pep, mas meio escondido, sem letreiro na porta, e que no jantar não há opção de escolha, a degustação de tapas é o que servem; quem é da terra diz que é o melhor. E para quem quiser saber como comem as pessoas da cidade, o restaurante descolado dos locais é o Semproniana (Carrer Rosselló, 148, telefone +34 934 532 820), com uma cozinha criativa e um cardápio que muda de acordo com o que foi encontrado no Mercado no dia, tudo fresquíssimo e super saboroso, sem luxo ou grandes requintes mas bem oroginal.
Estando em Barcelona não se deve deixar de pegar um carro ou trem e ir passar uma tarde em Girona, uma hora de distância, cidadela com um bairro medieval de tirar o fôlego. E já que você foi a Girona, vai tentar marcar uma mesa — o quanto antes, por favor — no El Celler de Can Roca (Carrer de Can Sunyer, 48, Girona, telefone +34 972 22 21 57), o segundo melhor do mundo na célebre lista San Pellegrino, com 3 estrelas Michelin. Capitaneado pelos 3 irmãos Roca, o restaurante fica num bairro simples, onde a mãe deles fazia comida de pensão e onde eles aprenderam tudo. É im-per-dí-vel. E, vale dizer, nem é tão caro. O duro é conseguir a mesa: atualmente são 7 meses de espera!
Se você foi a Girona, planeje uma noite a dormir no vilarejo de Peratallada (literalmente, Pedra Talhada), um local mágico e impressionante. Cidade murada, Peratallada parou no tempo. Se você chegar lá, como nós, por volta das 19h00, vai ver a luz do dia caindo e suas pedras caramelo iluminadas num cenário fantástico e totalmente fantasma. É que a maioria dos habitantes trabalha em Barcelona e a esta hora ainda não voltaram. Ainda ali perto, várias cidadelas que remontam à época do comércio dos gregos, como Empúries, outra jóia, esta à beira-mar.
De volta a Barcelona, o que mais me fascina na cidade é seu Barri Gòtic (bairro gótico), o maior e mais bem preservado da Europa. O claustro da Catedral, com seus 13 gansos brancos, as colunas romanas do Templo de Augusto, o antigo Palácio Real construido na Idade Média aproveitando-se da Muralha Romana, as vielas tortuosas e cheias de mistério.
No que se refere a Gaudí, o mais badalado nome na cidade, além das obviedades da cidade, arranje um jeito de ir até a Colònia Güell (uns 20 minutos para fora de Barcelona), vila operária patrocinada pelo mecenas de Gaudí onde ele fez seu primeiro “experimento” que daria frutos na Sagrada Família: uma igreja destinada aos trabalhadores da fábrica, habitantes daquela vila, e que nunca foi terminada. Ficou a Cripta, mas isso, por si só, já é impressionante. Peça que lhe falem da acústica, de como Gaudí pensava a arquitetura em sua mais completa forma, incluindo a sonorização do espaço. O cara era mesmo um gênio.
RAFAEL FONSECA
é pesquisador musical, cronista da Anna e organiza viagens musicais.